24 de abril de 2009

Brasileiros de Montreal – parte VIII

Luís Carlos Lopes

A cidade e a imigração (final)

Depois da Segunda Guerra, a cidade recebeu alguns milhares de judeus, hoje abrigando o maior número conhecido de sobreviventes dos campos de concentração e extermínio [27]. A presença judaica em Montreal já existia desde o início do século XX.

Vieram, a partir do mesmo fenômeno e da mesma geração, os portugueses, italianos, espanhóis, gregos etc. Durante as últimas quatro décadas, chegaram imigrantes da vasta região da francofonia, que inclui o Caribe (Haiti) e alguns dos países do Norte e do Centro da África e da Ásia, antes colônias francesas. É visível a presença, mais recente, de orientais, sobretudo de chineses, indianos, vietnamitas e paquistaneses, como também de europeus do leste, oriundos da diáspora da crise do socialismo real. Ao que se sabe, a vinda de milhares e milhares de latino-americanos prendeu-se às crises políticas, econômicas e sociais vividas na América Ibérica, a partir da década de 1960. Os fluxos de migrantes são muito mais um problema que nasceu na origem nacional de cada grupo.

 

A pequena presença de afrodescendentes relaciona-se à vinda de pessoas de países com forte presença negra no Caribe (Haiti) e de países africanos com a maioria negra. Considere-se, igualmente, a existência de um pequeno contingente de negros que chegaram lá na época colonial, na condição de escravos. Neste último caso, trata-se de famílias negras genuinamente canadenses, o que, aliás, gostam com razão de lembrar e reafirmar suas origens.

 

Os descendentes dos ameríndios do Canadá estão presentes em Montreal. Entretanto, suas presenças efetivas contrastam com suas invisibilidades sociais. Estão lá, vivendo os problemas de todos os ameríndios deslocados de suas populações e modos de vida originais. Estão presentes, pelo meio paradoxal de não existirem na contabilidade da cultura quebequense, tal como ela se expressa hegemonicamente na mesma urbe. Os antes senhores da região, agora vagam na sombra de suas histórias de bravos guerreiros e excelentes caçadores e produtores de peles.

 

O Canadá, país bastante aberto à imigração, a partir da segunda metade do século passado, vem recebendo gente de toda parte do planeta. Junto com os Estados Unidos, o Canadá de hoje é formado por um incrível mosaico de nacionalidades, culturas e religiões. Não se conhecem outros países que congreguem tantos imigrantes de origens tão diversificadas. Ambos, com suas especificidades, têm sido o destino de fuga dos problemas encontrados nos países mais pobres, que vivem desigualdades, guerras e outros problemas, e que não conseguem reter suas populações, por efeito das dificuldades vivenciadas.

 

A diferença de hoje, para outras épocas recentes, é que a imigração transformou-se em uma questão-chave na política interna e externa destes países. Os governos passaram a direcioná-la com maior cuidado e fazer com que ela atenda, sobretudo, aos interesses nacionais, tanto norte-americanos, como canadenses. A província do Quebec, bem como outras províncias do imenso Canadá, tem interesses próprios e vislumbram a questão da recepção dos que chegam, de modo particular. Por isto, trata da questão de acordo com seus interesses, que podem não coincidir com os do resto do país.

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Brasileiros em Montreal

Em termos numéricos e étnicos, os brasileiros são um grupamento minoritário, certamente, um dos menores do conjunto dos imigrantes locais. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, em 2007, estavam registrados, aproximadamente, três mil eleitores brasileiros residentes em todo o Canadá. Como esse recrutamento não é obrigatório, e muitos dos brasileiros têm dupla nacionalidade, este número é apenas um indicador secundário. O impressionante é que 1.329 destes declararam morar na cidade de Montreal. [28]

 

Nos registros dos brasileiros residentes, feitos até 2007 pelo Consulado [29], de adesão não-compulsória, estão listados cerca de dois mil inscritos. Em grande parte dos casos, inscrevem-se neste cadastro os responsáveis pelas famílias e não todos os seus membros. Estimando-se, uma média de mais dois para cada um dos mesmos, chega-se à quantia de seis mil brasileiros residindo em Montreal. Considerando-se a forte presença de solteiros, de casamentos interétnicos, os dados do TSE e a grande quantidade de pessoas, que desta cidade vai para outras regiões do país, pode-se estimar que o grupamento brasileiro atual é algo que oscila entre quatro e cinco mil habitantes. Portanto, algo equivalente a um por cento do conjunto dos imigrantes vindos de todo o mundo. Entretanto, é bom notar que os brasileiros continuam a chegar e a multiplicar suas presenças nessa cidade e no país.

 

Ao contrário de outras etnias, não existem bairros onde os brasileiros habitam, eles estão espalhados pela urbe, quase sempre nos lugares onde os preços dos aluguéis são mais convidativos. A visibilidade desses imigrantes é relativamente pequena, proporcional ao seu número efetivo e sua baixa taxa de agregação. Alguns poucos estabelecimentos comerciais usam da bandeira, da culinária e da música verde-amarelas para atrair suas clientelas. Não necessariamente todos são pertencentes aos brasileiros. Somente alguns são dirigidos por brasileiros e empregam mão-de-obra vinda de lá.

 

Em contrapartida, não há tensões fortes e particulares entre os quebequenses e os brasileiros. Não existe um rótulo que os separe dos demais imigrantes. Eles se relacionam razoavelmente bem com os portugueses, os demais latino-americanos e com as etnias com as quais possam vir a ter pontos de identidade e contato. Em relação aos habitantes nativos do Quebec, os brasileiros mantêm a mesma distância que os demais grupamentos de estrangeiros exercitam no dia-a-dia. Como se sabe, no cômputo das verdadeiras regras multiculturais, cada grupo fica em seu lugar e a vida segue o seu curso, sem maiores problemas. Tudo isto, pode parecer bastante estranho para os egressos das culturas abertas e humanistas do Brasil.

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Os brasileiros que estão em Montreal vivem uma realidade um pouco diferente dos outros imigrantes que vieram fazer a América, em especial, nos Estados Unidos. Na maioria dos casos, eles vieram para ficar, pelo menos até a aposentadoria [30]. A presença de brasileiros em situação ilegal é inexpressiva. Estima-se, por razões óbvias não existem estatísticas confiáveis, que menos do que 3% não possuem papéis, correndo o risco iminente da deportação. É bastante difícil permanecer no país como ilegal. A entrada por ar, mar ou terra exige visto e, para obtê-lo, é preciso preencher inúmeros pré-requisitos, em especial, sólidas provas de que o candidato tem meios de se sustentar com um padrão de classe média no Brasil. São raros os que chegam como turistas e tentam estabelecer residência.

 

Entrar, clandestinamente, pelas fronteiras norte-americanas é algo quase impossível. O Canadá está protegido de uma possível invasão massiva de imigrantes ilegais vindos do Terceiro Mundo. Predomina a legalidade, amparada no fato do país permitir a fixação de pessoas que atendam o que as autoridades entendem como o perfil adequado para migrar. Os critérios são basicamente: nível de instrução elevado, pelo menos o terceiro grau; bom estado de saúde, esta aferida por exames criteriosos; inexistência de qualquer tipo de pendência jurídica ou de passado criminal; meios materiais para sustentar o investimento inicial da imigração. Outros critérios, tais como, algum domínio das línguas (inglês e francês), profissões de interesse da política econômica e social do país, dentre outros, ajudam a facilitar o pleito da imigração.

 

Notas:

[27] Ver a obra de Linteau e a de Armony.

[28] Ver TSE no site: http://www.tse.gov.br/internet/index.html

[29] Ver arquivos do Consulado do Brasil em Montreal.

[30] Obviamente, com exceção dos que estão a estudo, missão oficial do governo brasileiro ou contrato temporário de trabalho.

 

Subtítulos das próximas partes do estudo:

  • Brasileiros em Montreal (final)
  • A parole dos brasileiros
  • Entrevistados de Montreal
  • Conclusões
  • Bibliografia

Leia:

1 .:

Mirian disse...

Deia!!!!!!!!!! que alegria ouvir sua voz!!!
Obrigada pelo carinho pelo seu recado no blog. Voces nao existem viu !!!
Respondi la no meu blog porque tentei escrever aqui mas nao estava conseguindo, vamos ver se hoje vai.
Muita saudade de voces!

beijos

Recent blog post: Flores no meu aniversario!

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